terça-feira, 16 de novembro de 2010

Marcelino

Eu estava me despindo, me preparando para tomar banho, já estava nu, quando resolvi afeitar a barba, antes de me banhar. Após isso o telefone tocou, era a minha amada mãe, trazendo a triste notícia do falecimento de meu pai, disse para ela que tomaria banho e iria até lá.
Coloquei o meu melhor terno, afinal seria o meu último momento na presença daquele que tanto me amou.
Fiquei lá no cemitério consolando minha mãe, fazendo-a se sentir bem, dizendo que onde ele estivesse estaria bem, e que ele não iria gostar de vê-la triste, e que ela teria que começar uma nova vida.
O velório e o enterro passaram, cheguei em casa e dormi, no dia seguinte fui ver como minha mãe estava, e recebi dela uma carta escrita por meu pai antes de morrer nessa carta ele dizia:

“Meu filho Marcelino, você foi o único filho que eu tive e o único que eu amei entenda uma coisa, sei que naquele dia em que você partiu era seu dia de partir, mas meu coração ainda não tinha aceitado muito bem essa idéia, reconheço, senti muito sua falta, sei que você sentirá muito mais a minha falta do que eu sentirei a sua.
Prometa-me que quando tiver um filho, seja menino ou menina, você será cuidadoso com as palavras, porque eu me arrependo de não poder em vida ter te pedido perdão.
Choro até hoje sei que a doença que eu tive e que está me matando aos poucos foi por ter guardado rancor.
Peço que você me perdoe, e perdoe a si mesmo por todos os seus erros.
Se você estiver lendo esta carta e eu já não estiver vivo, imagine apenas que estou te envolvendo em meus braços e te protegendo.

Obrigado,
Dennis.”


Eu chorei muitas lágrimas ao ler a carta tão sentida de meu pai que acabei me relembrando exatamente como tudo aconteceu.
Era uma tarde de verão, eu estava em casa assistindo a tevê, e meu pai me fazendo companhia, como ele sempre fez, desde pequeno. Naquele dia eu já estava com vinte e quatro anos, tinha acabado de concluir o curso universitário de jornalismo, havia enviado muitos currículos para diversos jornais e emissoras de tv, para que eles pudessem me contratar.
Meu pai era muito radical com algumas atitudes, mesmo ele tendo se formado em comunicação social também, ele nunca pensou em ter um parceiro, mas também quando ele fez tudo era novidade, e agora o mercado aparentava estar saturado, mas eu via novos mercados que meu pai não enxergava. E a discussão começou aí:

- Mas meu filho esse mercado já está muito cheio de profissionais muito bem qualificados, como você fará para trabalhar, ainda mais como jornalista?
- Paizinho, o senhor pode até ter um pouco de razão se estivermos falando das mídias tradicionais, mas temos também as mídias novas, que vem junto como uma grande evolução da Internet.
- Pode até ser meu filho que você tenha razão, mas você tem certeza que está realmente preparado.
- Acredito que sim.
- Continue assim e verá que nem tudo são flores.
- gostaria que você não estivesse aqui, e que você não trabalhasse nessa área, porque você não faz um concurso?
- Concurso pai, não sei se é o que eu quero, sei que a estabilidade que eles proporcionam é muito boa, mas o estresse também é muito grande, não quero isso pra mim.
- Você acha que as novas mídias vão te ajudar? De que forma?
- Claro que sim pai, todas as mídias novas são maravilhosas e eu estudei, acredito que será ótima ajuda. Pai vou montar uma agência de noticias que vai juntar uns quinhentos blogs em um único lugar, um portal de notícias, e eu já tenho até o nome e o local.
- Você sabe que eu não concordo com isso, não acho nada seguro que você monte seu próprio negócio, e os impostos como fará para pagar?
- Papai o senhor acha que eu vou abrir isso sozinho, não eu tenho ao todo vinte amigos que vão fazer tudo comigo, quanto aos impostos estamos realizando os cálculos, não vamos dever nada ao fisco.
- Mesmo assim meu amado filho, não acho seguro, preferiria se você estivesse com outra profissão em outro lugar, em outro momento.
- Pai assim não dá, parece que você não acredita no filho que tem. Eu vou acabar saindo de casa, parece que você não dá valor a minha presença, porque isso pai?
- Não é assim meu filho, só que eu não gosto de você trabalhando na mesma área que a minha, como se fosse fácil, mais coisa não é nada fácil, é muito difícil, não quero que você saia, mais se esse for seu desejo, a porta está destrancada é só usar, abrir e sair.
E eu acabei fazendo isso, arrumei minhas coisas sai pela porta e nunca mais vi meu pai desde aquele dia.
Minha mãe tentava anualmente fazer uma reunião entre nós, mas eu acabava dando uma desculpa e nunca mais vi meu pai.
Só fui vê-lo agora depois de enterrado.
E ainda recebi uma carta dele, hoje choro, porque entendi que ambos naquele dia estávamos de cabeça quente, acho que hoje eu não teria feito tamanha discussão.
Mas hoje eu estou bem sucedido, acho que meu pai teria orgulho.
Sou honesto e tenho pagado todos os impostos.
Ainda estou solteiro. Mas um dia eu me caso e terei muitos filhos e um deles ainda terá o nome de meu honorável pai.

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